Friday, December 29, 2006

Em tempos de cor

Para a felicidade que agora me bate a porta

acordei molhado e incompleto,
olhei me no espelho e não me vi,
seus rabiscos no papel beijou meus lábios,
em compassos marcados pelo tempo,
segui em movimentos fetais,
tentei sorrir

o sol sobre a cabeça
dora a pele intensamente,
esmoece a força
e prolonga o tempo.
no seu insano delírio febril,
sinto seu corpo em contornos sutis
evaporar com os 40 graus
anunciados no boletim de ontem.
líquida densidade engenhosa
lhe escorre pela face,
degenera e faz me embriagar
no sal da existência.

as horas passam
pra noite chegar nova.
o convite trilha a consciência...
pela brisa caminharemos mansamente.
o branco das nossas vidas
derramará toda beleza pra chegada
de uma nova estação.

Monday, December 18, 2006

Fragmentos II: nosso mundo

...,

li seu e-mail com um sorriso contido. não era necessariamente felicidade, nem tão pouco tristeza...uma sensação de..."promessas de". e o tempo e a distância não conciliadas para esse mundo instantâneo? gostaria tanto de tomar essa sopa até a última gota.
sinto esse mundo em que nos estivemos da última vez. e gostaria muito de estar nele por completo, rendido, entregue. minha vontade era ficar mais pra ter você. "e as horas irremediável". "porque é que tem que ser assim, se meu desejo não tem fim...". entretanto, alguma coisa existe e pulsa, e me mantém conectado a você, em pensamento, em energias, além do "tanto mar".


ontem a Jú chegou de lá. tava feliz, risonha, dizendo que aproveitou à beça aquele pequenim de lugar perdido no coração das pessoas. comentou que curtiu muito estar contigo...aí comentei: "pessoa linda, né?" pra ser razoável. mas não queria ser razoável, queria alcoól forte. mas o que fazer numa conversa por telefone, num dia frio em são paulo? não sei, mas alguma coisa doida dentro mexe. por você.


Foi bonita a festa, pá
Fiquei contente
Ainda guardo renitente um velho cravo para mim
Já murcharam tua festa, pá
Mas certamente
Esqueceram uma semente nalgum canto do jardim
Sei que há léguas a nos separar
Tanto mar, tanto mar
Sei, também, quanto é preciso, pá
Navegar, navegar
Canta primavera, pá
Cá estou carente
Manda novamente algum cheirinho de alecrim

Beijo imenso,
Tom.

São Paulo, 31 de julho de 2006.

Fragmentos I: aquela tarde

Princesa,

Sou eu novamente vindo diretamente do puxa-estica do dia-a-dia. Tirei um tempinho pra responder sua carta eletrônica tão linda, especial. Adorei ter recebido. Feliz por sentir que está à vontade em compartilhar, dividir o peso e a leveza da vida comigo (não que isso só esteja acontecendo agora, mas estamos nos conhecemos mais e mais, e isso é adorável!). Desculpa, porque sei que não há tanto motivo pra alegria. A Clarisse havia me dito que estava com uma conhecida no hospital, na UTI, mas não tive a dimensão do seu sofrimento. A perda dói muito. Enorme sentir-se sozinho num lugar escuro. Angústia.
Agora, lendo seu "emeio", vi que talvez fui um pouco insensível contigo. Não sabia que estava tão sentida...Não quis tocar no assunto pra dar leveza ao nosso encontro, mas não queria ser displicente. Sorry.
Engraçado, a vida é uma fusão de florzinhas com o perigo constate da grande tempestade. Lindo você se ater as florzinhas. A sua beleza singela. E grandiosíssimo. A morte é um tufão. Devastador. A gente nunca tá preparado , mesmo sabendo que um dia ela vem. Não lembro a parte em que Kurosawa aborda a morte em Sonhos. Quero assisti-lo novamente. Também gostaria de vê-la com outros olhos. Por outro lado, sabendo da finitude, temos a possibilidade de sugar todo sopro de vida. E embriagamos, sonhamos, amamos, dando o compasso durante a dança.
Agora, forças pra passar esse momento difícil. Pense nela bem, mesmo que isso signifique estar longe e definitivamente. "O que ficou nada vai mudar". Com o tempo, junto com os cabelos brancos, a gente coleciona deliciosas lembranças de momentos, pessoas. E nisso, uma certa sabedoria que no fim das contas pode virar blá blá blá de gente velha. Gente que já viu demais, ouviu demais, sofreu demais e, acima de tudo, amou demais. Engraçado, toda essa sapiência parece ser inútil já que a vida só vale se experimentada. Mas nem tudo se perde..."Levanta, tira essa cara que não é sua, e vai, não se entrega..."

Beijo grande.

Rio, 16 de novembro de 2006.